sexta-feira, 25 de agosto de 2017

FALSA DEMOCRACIA RACIAL

Fonte: Google

FALSA DEMOCRACIA RACIAL

Desembargador Valério Chaves Pinto


        Passados 129 anos do fim da escravidão negra no Brasil, a sociedade brasileira, infelizmente, ainda não conseguiu mudar o modo como lidar com o drama de sua penosa ascensão de escravo a assalariado e a cidadão, sob a dureza do preconceito racial discriminatório e perverso.
         Recentemente a imprensa brasileira noticiou que a piauiense Monalysa Alcântara foi eleita Miss Brasil-2017. Apesar do reconhecimento unânime dos jurados, a jovem de 18 anos, por ser negra, passou a ser vítima de ofensas racistas e de ódio nas redes sociais por parte de quem desconhece que somos uma nação etnicamente unificada falando a mesma língua e coesa numa mesma cultura e nos seus valores maiores.
         Mas não é somente nos concursos de beleza que a prática do preconceito tem se manifesta como uma praga na humanidade.
         Historicamente, sabe-se que este mal tem moldado os povos ao longo dos tempos. No estudo dos filhos de Abraão (Isaque e Jacó) vemos que muitos povos foram escravizados devido às suas diferenças – vistos como grupo do mal ou raças inimigas. Mas é na própria Bíblia onde vamos encontrar a resposta para o racismo: “Não pode haver judeu nem negro; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós sois um Cristo Jesus” (Gálatas, 3, 28). “Para com Deus não pode existir acepção de pessoas” (Atos, 10,34) e (Romanos, 2,11).
         No Brasil, apesar de inserido no texto constitucional (art. 5º, XLII) como crime inafiançável e imprescritível, são recorrentes os episódios de racismo nas ruas, nas escolas, no trabalho, nas redes sociais, nas competições esportivas, principalmente em jogos de futebol onde alguns torcedores do alto de sua ignorância, a pretexto de abalar o psicológico de jogadores adversários de pele negra, assobiam ou fazem gesticulação com o corpo imitando macaco.
         Recentemente uma mulher cliente de um salão de beleza em Brasília, se recusou a ser atendida por uma manicure negra sob a alegação de que era preta demais para arrumar as unhas dela.
         Um relatório das Organizações das Nações Unidas divulgado em 2015, aponta que no Brasil o racismo é “estrutural e institucional”. De acordo com a ONU, nosso país vive em uma falsa democracia racial, que nega a existência do racismo devido à miscigenação entre diferentes povos e raças. O último Censo Demográfico revela que o  preconceito de cor se manifesta de forma cordial, ou seja, finge-se que o problema não existe.
         Com o mapeamento do nosso código genético decifrado pelo método DNA, a ciência provou que, na verdade, a teoria de diferenciação da espécie humana por características físicas  (cor da pele, textura do cabelo, formato dos olhos e nariz) é efêmera. O que existe são variações genéticas de que se valem mentes vesanas para estimular o preconceito étnico nos seus vários degraus.
         A Constituição da UNESCO, ao confirmar sua adesão aos princípios proclamados na Carta das Nações Unidas (1948) determina que “a grande e terrível guerra que acaba de terminar não teria sido possível sem a negação dos princípios democráticos, da igualdade, da dignidade e do respeito mútuo entre os homens, e sem a vontade de substituir tais princípios, explorando os preconceitos e a ignorância, pelo dogma da desigualdade dos homens e das raças”.
         A advertência constitucional nos mostra de forma bem nítida, que todos os povos e todos os grupos humanos, independentemente de sua origem étnica ou diversidade de forma de vida, cor ou condição social, contribuem para o progresso das civilizações, não podendo sob qualquer alegação, servir de pretexto a preconceitos raciais nem legitimar práticas discriminatórias causadoras de estragos no mundo, na medida em que quando alguém se refere ao racismo de forma explícita, não só está praticando uma agressão, como um hediondo crime contra a humanidade
         Hoje, com o avanço da antropologia e da sociologia, não há mais espaço para considerar “raça superior” como querem alguns desavisados.
         Com efeito, além de um simples gesto para humilhar um ser  humano, seja miss Brasil, seja trabalhador da bola ou não, só porque é diferente na cor da pele, o que mais assusta, é a concentração do ódio alimentando a alma de gente sem visão de um dos maiores valores do gênero humano: o pleno estabelecimento da paz entre os povos.     


                            (Agosto/2017)

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