quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Teresina em pedacinhos de mim

Fonte da foto: Turismo Teresina

Teresina em pedacinhos de mim

José Maria Vasconcelos
Cronista, josemaria001@hotmail

       Nestes 163 anos de existência, cada velinha do bolo não consegue apagar-me pedacinhos e estampas de meu álbum. Andando pelo centro ou arredores da capital, uma paixão impregnada em mim. Só se ama quando se conhece.

         Entrar na Igreja de São Benedito é saborear um capítulo da minha cidade. 4 da madrugada de domingo. Sinos tocavam, em três momentos, para a missa das 5.De todo canto da pequena Teresina, dava para se ouvir a convocação sagrada. Meu pai me levava, na garupa da bicicleta, da Piçarra à igreja. O templo enchia-se de fiéis. Frei Heliodoro e dezenas de cantores, no coro superior da igreja, encantavam corações.

         No romance O MANICACA, 1901, o magistrado Abdias Neves retrata Teresina dos últimos anos do século 19 e início do século 20.     O romancista descreve a capital de poucas quadras, praças e ruas. A cidade acabava nas confluências das Igrejas São Benedito, Nossa Senhora das Dores ou Mercado Central. Rapazes e adultos exibiam bengala, terno, cartola e ginete. A vida social circulava, praticamente, nos arredores da Praça da República (Deodoro ou da Bandeira) e Igreja do Amparo. Sem calçamento, água canalizada, energia elétrica; somente lampiões pendurados em postes. Chegavam miseráveis retirantes da seca de 1877, famintos e extorquidos por espertalhões. No Nordeste, morreram mais de 500 mil cidadãos.

A modesta Teresina, fundada em 1852, acabava no rústico cemitério de negros e expurgados, no Alto da Jurubeba, onde Frei Serafim de Catânia construíra a Igreja de São Benedito, 1874/1894, em homenagem ao santo frade leigo, nascido na Sicília, filho de escravos etíopes. Da Igreja de São Benedito, estendia-se a Estrada Real, a futura Avenida Frei Serafim, cercada de florestas e sítios, até o Rio Poti, de onde escravos extraíam pedras e areia para construção do templo.

A primeira geração de Teresina desfrutava a Praça Deodoro. A segunda curtia a Praça Rio Branco. A terceira, a Praça Pedro II. A contemporânea, a praça da alimentação do shopping. A primeira com suas bengalas, ternos, cavalos e chapéu. A segunda, divertindo-se no Bar Avenida, por trás da Igreja do Amparo (restam velhinhos sentados nos bancos da Rio Branco, remoendo vetustas paixões). A terceira, maioria sessentona, da Praça Pedro II, não cansa de remoer velhos apetites da carne da Paissandu, das tertúlias do Clube dos Diários, do apito da corneta, mandando as virgens voltar pra casa, às 9 horas, depois de rodarem a praça. Jovens contemporâneas, mais avançadas que as seletas da Paissandu, avisam aos pais que vão ao shopping, mas sabe Deus com quais intenções, pois camisinha virou moda. Bengalas, que nada! A onda é selfie.

Teresina dos arranha-céus, intensa vida noturna, restaurantes de primeira, sensores em cada poste para flagrar dinheiro dos motoristas, mas não aprendeu a construir calçamento de vergonha ou criar polícia municipal. A cidade orgulha-se das escolas classificadas no ranking nacional e pena por engolir gororoba de gestores de obras inacabadas. Porém mazelas não me roubam a paixão pela cidade.     

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