segunda-feira, 28 de maio de 2012

Voando com o velho Braga



M. Paulo Nunes

Foi com muita tranquilidade, que realizamos recentemente um voo direto de S. Paulo a Teresina, após mais uma visita das que periodicamente fazemos àquela cidade para realizar exames de saúde, com a mais absoluta segurança. Faltou-nos, entretanto, uma coisa importante para manter o bom humor e o equilíbrio na viagem, ou seja, comida a bordo. Não, é claro, com a fartura de antigamente, quando viajar de avião era uma festa ou uma farra, e hoje constitui “o mais triste dos prazeres”, como diria a fabulosa Madame de Stäel, quando viajava para o exílio, para cumprir um edito de Napoleão Bonaparte, de quem era desafeta.

Mas, embora faminto, tive, no meu caso, outra compensação, a companhia do velho Braga, na certidão de nascimento, Rubem Braga, a que os seus leitores poderiam acrescentar o cognome de nosso cronista-mor. Alguns o consideram do mesmo nível de Machado de Assis, o que constitui um exagero, dada a universalidade do “bruxo do Cosme Velho.” Mas esta é outra história.

O que posso acrescentar é que os dois diferem fundamentalmente na temática. Ambos cronistas da cidade e, no caso, da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, o autor de Dom Casmurro é o cronista, e também contista e romancista, da classe média urbana, enquanto que o velho Braga, seguindo a lição do Modernismo, que ora completa 90 anos, introduziu o povo na criação literária, como ocorreria com os demais representantes dessa corrente em nossas letras, a exemplo do romance de 30 ou de documentação sociológica da vida brasileira, de que destacaríamos, “a vol d’oiseau”, José Américo de Almeida, Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Jorge Amado e Rachel de Queiroz.

O livro de que me utilizei para este passeio ou por esta volta ao passado, em companhia do velho Braga, foi 200 Crônicas Escolhidas (Seleção Saraiva – Edição Best – Rio de Janeiro, 2011). Aí são recolhidas as melhores crônicas de todos os seus livros, em ordem cronológica de publicação, quais sejam: O Conde e o Passarinho, Morro do Isolamento, Com a FEB na Itália, Um Pé de Milho, O Homem Rouco, A Borboleta Amarela, A Cidade e a Roça, Ai de Ti, Copacabana!, A Traição das Elegantes.

Não pratiquemos uma desatenção com os demais oficiantes do mesmo credo, como Joel Silveira, Fernando Sabino, Otto Lara Rezende e outros monstros sagrados. Mas, depois de João do Rio, pseudônimo literário de Paulo Barreto, o cronista-mor da “belle époque”, autor daquela admirável farsa vicentina O Homem da Cabeça de Papelão, ninguém, como o velho Braga, marcou tão fundamente a sua época. Façamos assim o mesmo voo. 

Fonte: site da APL

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