sexta-feira, 25 de maio de 2012

Uma luta de Sísifo


Cunha e Silva Filho

Durante boa parte do meu tempo de magistério lecionando no ensino fundamental e médio particular e no nestes mesmos níveis por concurso de provas e títulos no ensino público municipal e estadual, quase estou firmando a convicção de que os professores brasileiros lutam em vão. Uma vez, uma diretora de uma escola municipal, no meu início de carreira, me alertou para que não continuasse no magistério, uma vez que ele só me traria dissabores, o que se traduzia em baixos salários, falta de perspectivas e promessas por parte dos governantes de que as coisas melhorariam.

E assim foi. Entravam governos e saíam governos, e a situação angustiante continuava. Parecia um castigo dos deuses profanos ou das mensagens dos oráculos. contra a nobre carreira do professor. Os salários eram tão baixos que um professor nem mesmo poderia financiar uma casa própria, alugar um modesto  apartamento,   sobretudo se o professor tinha família e todos dependiam de seus minguados salários. Longos anos se passaram, e nada melhorou substancialmente. E sabem por quê? Porque os governantes não respeitam a classe dos professores, com exceção do nível superior e mesmo assim apenas nas universidades púbicas (e algumas particulares) que, da mesma forma, já passaram por péssimos períodos nos quais os professores tinham vencimentos incompatíveis com a relevância da cátedra superior e a manutenção dos trabalhos de pesquisas. Programas humoristas, novelas de televisão, passaram a caricaturar a situação dos professores. A escola do professor Raimundo do Chico Anísio (1931-2012) foi um deles..

.Ora, essa dessacralização dos docentes, na consciência de uma sociedade que valoriza o fetiche do status econômico, sofre a influência negativa da caricatura e,  por sua vez, passa a desvalorizar a vítima carnavalizada.  Na época, escrevi artigo criticando o citado programa de humor. Ou seja, o humor ali teve efeito negativo e não de castigar os responsáveis pelas péssimas condições sociais do docente.

Não sou prosélito do governo do Presidente Lula, mas estou convencido de que, no seu segundo mandato, ele foi o único mandatário que valorizou os professores universitários e os professores federais dos níveis fundamental e médio. Daí o respeito que as universidades têm tido por ele, daí os títulos de Doutor Honoris Causa que lhe têm sido outorgados.

Ao contrário, governadores e prefeitos, e vejo pela perspectiva de minha experiência como cidadão que mora no Rio, tanto no tempo da ditadura, quanto na fase democrática, pouca atenção deram aos professores públicos. Os movimentos de  grades e demoradas  greves deflagradas contra o governo do estado do Rio de Janeiro e a prefeitura do município do Rio se tornaram homéricas até que houve um período de exaustão por parte dos professores. Lideranças de professores se reuniam com representantes dos governos, às vezes chegavam a um acordo razoável de reajustes e de planos de carreira que prometiam seriam implementados. Algum tempo passava.  A inflação ia corroendo o que se conquistou e, dentro em pouco tempo, a situação angustiosa do arrocho salarial voltava ao despenhadeiro de Sísifo. Este teria que rolar novamente a pedra para cima do rochedo.

Foram inúmeras essas experiências malogradas. Governadores(inclusive Brizola),   cariocas e prefeitos cariocas  não cuidaram bem do ensino. Um prefeito do Rio, o Saturnino Braga chegou mesmo a falir as finanças da prefeitura, levando os professores municipais a um estado de penúria, falência administrativa - diga-se a bem da verdade – só sanada pelo prefeito Marcelo Alencar. Nos meus longos anos de magistério, rigorosamente nunca houve um bom governante que privilegiasse a educação. A expressão plano de carreira se esvaziou do seu sentido concreto, virou retórica vazia de promessas mentirosas de candidatos a governos estaduais e a prefeituras. Lembrava uma afirmação triste e desanimadora de um ex-governador de São Paulo, Orestes   Quércia,  segundo a qual professores nunca teriam bons vencimentos. Era o castigo de Sísifo que parece permanecer até os dias atuais.

Agora mesmo, os professores municipais do Rio de Janeiro estão se mobilizando para uma assembleia a ser realizada na UERJ e ao mesmo tempo levando proposta salariais que seja mais digna do exercício do magistério. A atual  situação  dos professores é vergonhosa  para o  povo carioca, ao passo que as reivindicações justas da parte dos  docentes, se atendidas, melhorariam as aflições do professorado. Desanimados, tendo perdido o prestígio da sociedade que os vê como pobres citados, sem status social e sem dignidade e respeito da população, os professores cariocas estão empunhando uma bandeira que há tantas décadas tem enlameado os valores da saber, do estudo tão essenciais ao desenvolvimento de um nação que se quer enfileirar-se entre as sociedades desenvolvidas tecnológica e cientificamente,como a China, o Japão, os Estados Unidos, a França, a Alemanha, a Suécia,, entre outros.

O Brasil não vingará em sua expansão  industrial e tecnológica se não preparar seus filhos das camadas mais pobres ou paupérrimas em escolas com professores bem formados, atualizados, bem remunerados, com um sistema de educação sintonizado com o mundo moderno. Não é somente distribuindo aparelhos da área da informática, através de processos de inclusão digital, que as nossas criança e jovens sairão do buraco da ignorância e e de uma educação deformada. Não adiantam prédios bem equipados se lá dentro não existem professores bem pagos e desejosos de levar a educação brasileira a uma patamar de níveis das melhores escolas públicas do mundo.

Investir em verbas para a educação que não sejam desviadas para outros objetivos desconhecidos e inconfessáveis é imperativo de um governador ou de um prefeito bem intencionado e que respeita a formação cultural dos alunos. Reciclar professores é importante, mais importante ainda  é dotar os mestres de uma vida condigna para desenvolver suas aulas, estudar, aperfeiçoar-se e, assim, devolver aos alunos toda a sua experiência e resultados de estudos.

Na luta entre campanha salarial e melhoria do nível de ensino de nossas escolas municipais e estaduais devem estar envolvidos constantemente, além dos professores, mães e pais dos educandos, sempre juntos, de mãos dadas, cobrando eficazmente das autoridades educacionais medidas concretas e não paliativos ou promessas que, até hoje, não têm sido cumpridas. Nomear também para secretários de educação professore, pedagogos ou educadores de reconhecido valor moral e intelectual e não apaniguados políticos é outra  exigência imediata e fecunda. Eliminando esses obstáculos altamente nocivos à educação seria um grande passo de um governante que respeita seus eleitores e o dinheiro do contribuinte. Do contrário, a luta dos docentes será um trabalho de Sísifo..

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