segunda-feira, 21 de maio de 2012



Olavo Pereira da Silva Filho

O Decreto Municipal nº 12.048/14/04/2012 que tomba o edifício sede do Jockey Club do Piauí, chega ao noticiário como uma efusiva manifestação de que os gestores públicos têm consciência da memória da cidade. Será?!
Para entendermos o significado desse ato no contexto da paisagem cultural da cidade precisamos projetar um sentimento de estima pelas referências que consubstanciam identidade social. Não raro, esse sentimento encontra-se incubado em mentes presas a um passado condenado à extinção. Isso nos mais idosos, porque as novas gerações pouco ou nada sabem do passado dessa cidade. Nessa Chapada do Corisco, a alienação e a falta de estima pelos bens culturais é um estigma de um modo de ver e de sentir, que interage no meio ambiente, delimitando fronteiras do desenvolvimento social.
Nisso, há muito desconhecimento que, aliado à informações desvirtuadas, não raro praticadas por agentes públicos, caracterizam um preconceito à preservação do patrimônio cultural. Contudo, frente ao ato em tela, não se pode dizer de desconhecimento. Além do que, esse complexo não está na lista de “monumentos” objeto de “proteção” da Lei nº 3.563, out/2006, nem tampouco no IPAC-TE (Inventário de proteção do Acervo Cultural de Teresina, realizado pela própria Prefeitura). No que então, esse prédio consubstancia identidade à cidade, para merecer a aplicação desse suporte legal?
O Jockey, embora na origem vinculado a criadores de cavalos, foi nos anos sessenta, enquanto clube de lazer, que talvez mais tenha se projetado na vida social da cidade, inclusive agregando toponímia ao bairro. Essa atividade seria o principal argumento para a proteção oficial desse complexo. Ou seja: mais pelo uso que marcou aqueles anos dourados, que pela arquitetura propriamente dita, já tão reformulada ao longo do tempo.
De suas edificações de origem nada restou. De sua arquitetura atual, não se pode dizer de expressão imprescindível ao quadro histórico da arquitetura de Teresina, pois se assim o fosse todas as outras com essas características, igualmente deveriam receber o mesmo tratamento da salvaguarda oficial. Também não se sabe de movimentos pela a preservação especifica dessa edificação, enquanto componente da paisagem tradicional, senão do Club propriamente dito, enquanto lugar de lazer familiar, muito diferente dos estrondosos espaços musicais que hoje se espalham pela cidade.
Do que chegou aos dias atuais, o que me toca é um sentimento de perda - tempo de piscinas, quadras e bailes. Daquele cenário não esqueço os antigênicos vestiários, a fascinante piscina e o pitoresco restaurante aberto e coberto de palha. Nesse trajeto da Avenida Nossa Senhora de Fátima, não mais o encontro. Reformas e ampliações o levaram ao estado atual, enquanto o uso, como pátio de espetáculos, o distancia de suas antigas concentrações de convivências particularizadas.
Nesse contexto, em que o limite do tombo se restringe ao edifício sede, por si só insuficiente para caracterizar o Club, além de anunciadamente passível de adaptações comerciais, evidencia-se não só a desmemorização desse ambiente, em que pátios, piscinas, quadras e demais áreas livres deveriam ser considerados partes indissociáveis desse conjunto, mas a liberação desses espaços para novos empreendimentos. Para isso, a lei de uso do solo seria suficiente. Mas essa, ao selecionar 168 “FACHADAS”, condena mais de 1000 outros ao desaparecimento, como de fato está a ocorrer. Falso propósito que, aliado a esse dito ato de proteção, expressa a total falta de apego ou de apreço pelas raízes culturais dessa cidade.
Se o Jockey é lembrança merecedora de revivências, por que não se dizer o mesmo das históricas referências do centro antigo, tão aviltadas pelo crescimento desordenado, estimulado pela próprias políticas públicas?
Esse é o ponto que mais preocupa nessa ação de tombamento: a desproteção de tudo o mais inventariado pela Prefeitura em 1988 e 2010. O que se vê nesse ato não é uma preocupação com a memória histórica da cidade, de suas edificações tradicionais, nem mesmo com a memória desse Club. Mas o aval para novos empreendimentos, em detrimento dos valores históricos (ambientes, piscinas, quadras, equipamentos e terreno) que caracterizam o Club. Por outro lado, um clube são seus sócios. Assim, em que pese a nostalgia, só o uso compatível pode preservá-lo, a exemplos de tantos outros espalhados pelo Brasil, em franca e saudável atividade.
Essa é a chancela oficial da preservação. Esse é o selo dos que decidem o destino dessa cidade.

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