sábado, 16 de abril de 2011

LIVRO E LITERATURA


FRANCISCO MIGUEL DE MOURA


Nem todo livro é literatura. O grande público não sabe ou não avalia, pois a indústria cultural age primeiro. O que é um livro? Simples. Miguel Guarani, meu pai e professor, tinha uma definição: “Livro é uma porção de folhas de papel com textos escritos à mão ou datilografados, reunidas e presas por uma lombada”. Ele dava o exemplo de um substantivo concreto: o livro. Mestre Miguel não era nenhum bobo, sua definição de livro era praticamente a que estava no dicionário.

E literatura, o que é? Aqui a definição se complica, pois não é uma coisa concreta. Antigamente, tudo que estava escrito era literatura. Por quê? Bem, porque os conhecimentos se transmitiam verbalmente, não havia papel, não havia livros. Escrevia-se em pergaminho, em tijolos de barro, pedra, etc. Portanto, religião, filosofia, ciência e literatura eram todas englobadas no termo literatura, uma derivação de letra.  Mas, com o passar do tempo, ciência, filosofia e religião se desenvolvem e a definição de que “literatura é tudo o que se escreve”, passa a ser uma coisa estranha, extravagante. Literatura é letra e conteúdo, é o trabalho com a palavra e com a língua no sentido de captar imagens e símbolos e, através destes e da forma expressa, criar, recriar mundos diferenciados do real, mundos abstratos por assim dizer, porém com um sentido crítico da realidade. A linguagem da literatura é a dos sentimentos e da plurissignificação em obras escritas: poesia, conto e romance – os gêneros principais.          

Todo esse confronto entre livro e literatura me veio após ter ouvido do confrade acadêmico, Prof. Jônathas de Barros Nunes, numa das nossas reuniões na APL, que “o Lula é um livro”.  Concordei que a biografia de Lula, escrita a soldo pelos jornalistas, equivale realmente a um livro, mas jamais a um livro de literatura. E, aqui completo: não é também uma história que sirva de exemplo – “a de como um analfabeto, nordestino, chegou a ser presidente”. É emocionante, sim; vende, sim. Mas literatura não é só isto. Cadê a forma, a criação, o conteúdo? Lula representou o que foi o povo brasileiro até aqui: analfabeto e subdesenvolvido. Mas, está provado que só a educação transfere renda, justo o que as democracias modernas proclamam. E o que Lula fez? Não desenvolveu a educação e a cultura e transferiu renda apenas como esmolas, com as tais bolsas-estudo. Lula, nas suas falas desconchavadas, sempre fez propaganda da falta de cultura, de leitura, de educação. Pode ser um exemplo para o Brasil, que quer ser uma nação moderna e poderosa?

Não queremos dizer que todo livro de literatura é bom. Mas, na verdade, as grandes idéias, os grandes sentimentos foram mais bem divulgados e digeridos pela grande literatura, em obras como as do Renascimento, de Dante, Virgílio e Camões aos clássicos franceses, russos, ingleses como Renan, Victor Hugo, Shakespeare e tantos outros. No Brasil, de Euclides da Cunha a Gilberto Freire e a Machado de Assis. Nossa literatura é imensa e de qualidade, levando-se em conta a idade que tem o Brasil de independência cultural (do Romantismo para cá). Uma pena é que esteja relegada pela mídia, para que mais bestsellers sejam vendidos.

Assim, quando nosso poeta Castro Alves, cunhou os versos: “Livros, livros à mão cheia, / Mandai o povo pensar: / O livro caindo n’alma / É gérmen que faz a palma, / É chuva que faz o mar”, de forma alguma confundia literatura, poesia, cultura, com qualquer bestseller, seja ele de Paulo Coelho ou de Sidney Sheldon, que vendem milhões e fazem mal a milhões, porque mantêm esses leitores na pasmaceira do “consumismo” estacionário ou deletério.  Consumir é sinônimo de anestesiar-se.  Mas, livro não é sinônimo de literatura. Um é substantivo concreto, o outro é abstrato.

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