quarta-feira, 24 de março de 2010

DIÁRIO INCONTÍNUO

Charge do Cineas Santos, feita pelo incomensurável Netto, minino ladino e arteiro de Bitorocara

24 de março

O VELHO ANCIÃO

No sábado passado, estive na Oficina da Palavra, pertencente a Cineas Santos, para tirar fotografia de um belo quadro do Amaral, em que aparece um goleiro em um voo espetacular e talvez um tanto espetaculoso, para ilustrar uma crônica que fiz em homenagem a dois grandes goleiros de nosso estado: Coló e Beroso, que marcaram época, o primeiro a defender o Caiçara, e o segundo, como guardameta do Comercial. Como goleiro, com atuações quase sempre regulares ou boas, ao menos segundo meus amigos, fui admirador dos dois, embora, por ser caiçarino, tivesse certa predileção pelo Coló, goleiro estiloso, cujas enfeitadas “pontes” admirava e aplaudia. Também queria fotografar um quadro do saudoso Fernando Costa, que conheci, cujo talento artístico apreciava. Lamentei sua morte trágica e precoce, décadas atrás, em pleno carnaval. Quando eu estava nesse mister, chegou o Cineas Santos, que foi meu professor em 1976, no Cursão. Nós, todos os alunos, o admirávamos, mesmo os que não eram tão interessados em literatura. Garoto interiorano, fanático por literatura, gostava imensamente de suas aulas. Acompanhei o lançamento de Ciranda, no Theatro 4 de Setembro, e com muito gosto li suas páginas. Rapaz um tanto tímido, um dia criei coragem e lhe mostrei alguns poemas e um ou dois contos meus. Cineas os leu, e com a sua proverbial franqueza me disse, com ênfase, que eu tinha “garra”, mas me aconselhou a ler os poetas modernos, dos quais, entre os que ele citou, me lembro bem de João Cabral de Mello Neto. Nessa época, deslumbrei-me com o jornal de cultura Chapada do Corisco, editado pelo Cineas, que estampava os belos versos do poeta Paulo Machado, intelectual do mais alto valor e honesto, como cidadão e como ser cultural. Entretanto, já no início do ano seguinte (1977) retornei a Parnaíba, para cursar Administração de Empresas, pois fora aprovado no vestibular, bicho papão na época, uma vez que existia apenas, como entidade de ensino superior, a Universidade Federal do Piauí. Devo acrescentar que Cineas era um verdadeiro mestre; suas aulas eram fascinantes e atraiam o aluno, mormente aqueles que, como eu, amavam literatura. Como pessoas físicas, e não instituições, ele e o professor Raimundo Nonato Monteiro de Santana são os dois maiores editores do Piauí. Apesar de vigoroso, enérgico e dinâmico em seus sessenta e poucos anos de vida, em auto-ironia ou talvez como catarse, para afastar o fantasma da velhice, que ainda vem longe, deu para chamar-se a si mesmo de o “velho ancião”, com a proposital ênfase da redundância. Conquanto, pelas circunstâncias da vida, não tenha sido um amigo próximo, acompanhei os seus permanentes e constantes sucessos, como escritor, editor e promotor de eventos culturais. E sempre lhe reconheci e aplaudi os méritos.

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